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Na mesa ao lado

 

Na mesa ao lado, há um poeta.
Sei que o é porque tem cara de poeta.
Porque tem olhos de poeta.
Tem boca de poeta.
E orelhas de poeta.
Debruça-se como um poeta sobre um pequeno caderno preto.
De poeta.
Olha com avidez de poeta as adolescentes ruidosas que passam.
Cobiça-as como um poeta.
Saliva tal e qual um poeta.
Será sensível e bom como todos os poetas.
Excepto os que não o são.
Notei que olhou para mim e fez cara de poeta.
E outra vez agora mesmo.
Dissimulado como só um poeta consegue ser.
Ou serão apenas gases de poeta?
Afinal, os poetas também têm intestino.
Mesmo que seja intestino de poeta.
E vejo que tem à frente o resto de um hambúrguer.
De um Big McPoeta (marca registada).
Não. Está mesmo a olhar para mim.
Tornou a escrever no seu pequeno caderno de poeta.
Escreverá sobre mim este poeta?
Estará a incluir-me nalgum soneto alexandrino?
Sacana do poeta!
Ele que não se atreva.
Senão, perco a compostura, levanto-me daqui, vou-me a ele,
E prego-lhe um tabefe nas bochechas gordas de poeta.
Ou talvez lhe pergunte se gosta do Cesário,
Também ele um valente poeta.

 
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